AVISO!!! RL “Chegou a hora de dizer não aos grandes bancos”

Day 1,742, 08:50 Published in Portugal Portugal by RATM1917

Um pequeno professor de História combate a troika em Espanha. Ao i diz que chegou o momento de portugueses, espanhóis, italianos e gregos recusarem as políticas de austeridade, nem que para isso tenham de se revoltar.

Há mais de 30 anos, uma pequena localidade da Andaluzia não aceita as regras que foram ditadas a todas as outras. Não há muros que separem Marinaleda do resto da Espanha, mas a vida e as regras são diferentes. Aqui ninguém está desempregado, as decisões são tomadas em comunidade e a habitação e a educação são quase gratuitas. À frente da câmara de Marinaleda está um antigo professor de História que tem participado em todas as lutas. Há uns dias, Juan Manuel Sánchez Gordillo acompanhou os activistas do Sindicato da Andaluzia dos Trabalhadores numa acção. Entraram em dois hipermercados, encheram vários carrinhos com alimentos de primeira necessidade e saíram sem pagar. Os produtos foram dados aos pobres. O governo processou-os. Os patrões chamaram-lhe ladrão. A imprensa comparou-o ao Robin dos Bosques. Recusou a alcunha dizendo que “na Andaluzia não são os pobres que roubam os ricos, mas os ministros, o capital financeiro e os bancos alemães é que roubam o povo”. No entanto, há uma referência que não descarta, afirma que Cristo foi o primeiro revolucionário e confessou, ao diário espanhol “El Mundo”, que “gostaria de converter-se num Gandhi do século xxi”.

Acredita que o modelo de Marinaleda pode ser expandido a outros povos na Andaluzia?

Totalmente. O que falta é vontade política. Nós conseguimos terra, lutando por ela durante 12 anos. E fizemos com que a terra, os frutos dela, e a agro-indústria que criámos servissem para dar trabalho a todos em vez de dar grandes lucros a muito poucos. Foi por isso que criámos este modelo comunitário em que todos ganham o mesmo e em que o objectivo, volto a repetir, é dar trabalho a todos e não obter lucros para muito poucos. Conseguimos garantir habitação barata, municipalizando o solo, e fazendo com que a câmara suporte a construção, com auxílio dos interessados. Construímos habitações de 90 metros quadrados em que o munícipe paga 15 euros por mês. Tudo isso pode ser feito em qualquer parte do mundo. A democracia directa em que toda a gente pode participar nas decisões, pode ser praticada em todos os lugares. O orçamento participado em que os cidadãos decidem em conjunto os investimentos das câmaras municipais pode ser discutido por todo o lado.

Mas esta experiência está limitada a Marinaleda ou há outras localidades em que se caminha no mesmo sentido?

Estamos a tentar conseguir que outras localidades sigam esta filosofia. Estamos a ocupar terras que estão devolutas. Há jornaleiros que ocupam uma exploração com 500 hectares em Somonte que é propriedade da Junta da Andaluzia que se queria desfazer dela, vendendo-a a um privado. Há seis meses que os trabalhadores a ocupam para conseguir que seja explorada e dê trabalho à população local. Ocupamos também a herdade militar de La Torquilla, com 1200 hectares, onde quase nada se produzia. Em todos estes sítios os trabalhadores de várias localidades querem a terra para a trabalhar. Pensamos que o regime de propriedade na Andaluzia protege donos que não a exploram e não dão trabalho à população. Esse regime é um dos grandes obstáculos ao desenvolvimento da região.

Na semana passada participou numa acção em que eram retirados produtos de supermercados, sem serem pagos, para entregar a famílias com fome. Acha que, neste momento de crise, este tipo de acção pode ser espalhada por outros países da Europa?

Já dizia São Tomás que, não acredito que fosse revolucionário, em caso de necessidade todos os bens são comuns. Penso que quando falta tudo às pessoas, elas têm direito à alimentação e a uma vida digna. Oiço por todo o lado falar de direitos humanos. O que defendemos é que esses direitos não sejam só boas intenções teóricas e retóricas escritas em papéis, mas que sejam concretizados na vida real. Os direitos têm de ser transformados em factos concretos para a vida das pessoas, muitas das quais estão a ser forçadas, com esta crise, à marginalidade e à pobreza mais absoluta.

A crise tem empobrecido as pessoas. Há mais desemprego, menos Estado Social, mais privatizações de serviços públicos. Acredita que apesar disso ela possa desencadear uma alteração radical da sociedade contra esta situação?

É a nossa esperança. É preciso dizer basta. Têm de o dizer todos os povos da Europa: Portugal, Itália , Espanha, Grécia não podem aceitar o destino que lhes querem impor. A crise é resultado de uma economia que privilegia os lucros do grande capital financeiro. Esta crise – que está a ser paga pelos mais pobres e por quem trabalha – foi criada por uma economia especulativa que tem como único objectivo a maximização dos lucros dos grandes grupos financeiros. As especulações dos empréstimos do subprime, as bolhas imobiliárias, os produtos derivados que deram muitos milhões de euros a muito poucos agora estão a ser pagos por a grande maioria da população. A dívida não tem de ser paga. Quem provocou a crise é que a deve pagar. Devemos recusar estas políticas de austeridade e estes cortes nas despesas sociais que só provocam mais miséria. É preciso uma outra economia em que o sector financeiro esteja nas mãos de todos: é preciso uma verdadeira banca pública para apoiar as actividades produtivas que geram trabalho. Temos de desenvolver as energias alternativas de modo a ultrapassar o modelo de dependência do petróleo. É imperativo fazer uma revolução agrária, porque a actual política comunitária está a arruinar os pequenos camponeses da Europa: as verbas comunitárias são dadas em função da área da propriedade beneficiando os grandes latifúndios, e a política de preços estabelecida pelas instâncias europeias só provoca ruína. Hoje, em grande parte, os preços são, para o camponês, menores que os custos de produção. Qualquer dia não haverá agricultura na Europa. Não podemos aceitar que a Europa seja o maior importador de produtos agrícolas no mundo. É um disparate. O capital financeiro fugiu do mundo da construção quando rebentou a bolha especulativa do imobiliário e agora está a tentar controlar a produção de alimentos. É preciso expulsar a lógica do capital financeiro daí, se não o fizermos teremos ainda mais fome e pobreza do que já temos.

Qual foi a reacção em Espanha às acções do sindicato, nomeadamente à entrada nos supermercados?

Houve uma onda de solidariedade. Muita gente nos contactou no Estado Espanhol para se fazerem acções directas em outras localidades. Chegou a hora da rebeldia, é preciso dizer “não” aos grandes bancos alemães que mandam na Europa. Não há governo em Portugal, em Espanha, Itália ou Grécia. Os governos são um instrumento cego dos interesses dos bancos alemães. Contra a tirania dos grandes grupos financeiros que controlam os mercados, chegou a altura dos povos da Europa se erguerem e dizerem basta.

Este tipo de acções não conseguiu consenso no seu partido, a Esquerda Unida, há gente que se sente incomodada com a radicalidade daquilo que foi feito.

Há opiniões diversas. A Esquerda Unida é plural, há várias opiniões. Penso, no entanto, que as bases da Esquerda Unida concordam e apoiam o que fazemos.